Favela é Potência: A Importância da Fotografia Popular no Dia da Favela

05/11/24

Dia da Favela

No Dia da Favela (04/11), celebramos uma expressão cada vez mais popular: “Favela é Potência”., criada por Celso Athayde do Favela Holding. Mas, você sabe o que essa frase realmente representa? Por trás dela, há muita vida acontecendo, dignidade, trabalho árduo e muita coisa boa sendo articulada nas favelas do Rio de Janeiro.

As favelas são parte essencial do que faz o Rio de Janeiro ser único. São lugares de aquilombamento, onde vidas são construídas com resiliência e onde a cultura, a beleza e a alegria pulsantes do povo se manifestam diariamente. E é aqui que a fotografia popular se destaca, desempenhando um papel fundamental para mudar a narrativa histórica, frequentemente distorcida, sobre as favelas. Ao captar cenas do cotidiano com respeito, afeto e representatividade, essa prática tem se consolidado como um verdadeiro movimento de resistência cultural.

Para ilustrar esse movimento, conversamos com Nayane Silva, fotógrafa popular e educadora no projeto Imagens do Povo, do Observatório de Favelas. Nascida na Pequena África e atualmente moradora da Cidade de Deus, Nayane tem 27 anos e seu trabalho está focado em preservar a memória e discutir o direito à cidade. “Ser uma mulher preta e de favela é sinônimo de força e determinação. Sempre entendi que era capaz de alcançar o que quisesse, mas que, para isso, teria que me dedicar duas vezes mais”, conta ela. “Na favela, há muita potência. Eu busco, através do meu trabalho, contar histórias a partir de uma visão de dentro, de quem vive e conhece essa realidade. É fundamental que criemos nossas próprias narrativas.”


Ao questionar Nayane sobre como a fotografia popular transforma as narrativas sobre as favelas, ela explica que essa abordagem proporciona “um olhar de cuidado, afeto e respeito para aquilo que está sendo representado. É um olhar de representatividade e não de sensacionalismo.” Através dessa lente, Nayane e outros fotógrafos populares reivindicam o direito à cidade, mostrando pessoas em contextos de liberdade e desfrutando de espaços que, muitas vezes, lhes são socialmente negados.

O Surgimento da Fotografia Popular no Rio

A prática da fotografia popular no Rio de Janeiro ganhou força especialmente a partir dos projetos da Escola de Fotógrafos Populares (EFP) e da agência Imagens do Povo (IP), ambos oferecidos pelo Observatório de Favelas desde 2004.  Esses projetos, além de ensinarem técnicas fotográficas, proporcionaram uma formação política aos alunos, incentivando-os a questionar as narrativas tradicionais e a criar imagens que captassem a vida nas favelas de maneira honesta e empática.

A fotografia popular tem raízes no movimento de comunicação comunitária que floresceu nas favelas de toda a América Latina nos anos 1970. No Brasil, esse movimento encontrou um terreno fértil na Maré, onde a fotografia documental humanista praticada por João Roberto Ripper se entrelaçou com a fotografia popular. Ao longo dos anos, essa abordagem se consolidou como uma ferramenta de resistência, oferecendo uma alternativa às narrativas estereotipadas promovidas pelas mídias hegemônicas.

A Luta Contra a “História Única”

O trabalho de Ripper e de fotógrafos como Nayane vai além da simples documentação. Eles se opõem ao conceito de “história única”, uma ideia apresentada pela escritora nigeriana Chimamanda Adichie, que alerta sobre o perigo de narrativas únicas que reforçam estereótipos e justificam a violência do Estado. Ao contar apenas um lado da história, reforçamos preconceitos e limitamos a visão que a sociedade tem sobre a favela.

A fotografia popular é, portanto, um ato de resistência. Ao capturar a alegria, a beleza e a vida nas favelas, esses fotógrafos questionam a representação tradicional que associa esses espaços apenas à violência e à pobreza. Mais do que isso, eles desafiam a invisibilidade imposta pela sociedade e reivindicam um espaço legítimo na cidade para os moradores das favelas.

Essa luta pela construção de narrativas próprias também é uma forma de reafirmar o direito à cidade, um conceito central no trabalho de Nayane e de outros fotógrafos populares. Para ela, a fotografia serve como um canal para explorar e reivindicar a liberdade e o pertencimento dos moradores da favela nos espaços urbanos. Suas fotos revelam o cotidiano, a cultura e a força das pessoas, enfatizando que esses corpos e histórias têm o direito de ocupar a cidade em toda a sua complexidade.

No Dia da Favela, lembrar que “Favela é Potência” é mais do que uma frase de impacto: é uma celebração da diversidade e da riqueza cultural que as favelas representam. É também um reconhecimento da luta contínua pela dignidade e pelo direito de existir e contar suas próprias histórias, longe dos estigmas impostos.

Hoje no dia da Favela o Observatório de Favelas recebe a medalha Pedro Ernesto, uma homenagem à fotografia popular.

As Favelas fotografadas por Nayane Silva  que ilustram a matéria são: Morro da Providência, Cidade de Deus e Complexo do Alemão.

Autor: Juliana Neris
Fotos: Nayane Silva

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